Causos e Histórias.
20. Rua da Minha Vó
Na época que eu tinha nove anos, todos os fins de semanas eu ia para casa da minha avó brincar com meus amiguinhos, todos na mesma idade. Naquela época, havia poucas casas e uma grande variedade de árvores, imensos terrenos vazios com campo de futebol, lagos e até poços artesianos das construções indígenas que ali habitavam. Dentre as árvores citadas, existia “pé de jamelão”, mangueiras e cana-de-açúcar. Mas antes de conhecer e explorar essas feitorias, houve uma série de emoções no decorrer da descoberta.
Num sábado de manhã, nos reunimos para jogar futebol. Enquanto a partida rolava, peguei a bola e isolei, pois disseram que eu fiz falta em um garoto (...). O chute foi tão forte que a bola se perdeu no matagal adentro. A partir daí tudo começou.
Como chutei a bola, tive que ir buscar, com medo sem demonstrar, mas não resisti e voltei. Daí os moleques começaram a me zoar. Aí falei: “ah é, então vai lá”. “Eu vou sim”, falou o moleque. E aconteceu a mesma coisa: ele voltou.
Em seguida, apareceram nossos pais expulsando a gente do campo, pois queriam jogar bola. O dono da bola começou a chorar e todos fomos para casa. À noite, nos reunirmos para ir buscar a bola. À noite, com lanterna e tudo. Naquela época ficávamos até tarde da noite na rua, pois a violência e o tráfico não existiam naquele local. Fizemos planinho e tudo para buscar a bola. Chegando no campo, entramos no mato, vimos um bicho grandão e saímos correndo. Os dias foram se passando e nas diversas tentativas, vimos a árvore que andava, o mato que corria, a velha que falava sozinha e uma série de coisas.
Os nossos pais diziam que a velha ia nos pegar para criar e depois nos comeria, caso fizéssemos mal criação. Isso tudo nos fazia crer que aquele local era meio diferente. Até que num domingo nos reunimos para pegar a bola. Este dia foi um dos dias mais 007 que passei. Éramos nove. Formamos grupos de três para avançarmos, com estilingue, paus e pedras para nos defender dos seres estranhos, que pensávamos que existiam. E já prontos nos encaminhamos para buscar a bola com o tempo meio chuvoso e vento forte. Mesmo assim, seguimos... deparando-nos com o pé de jamelão... rimos. A mangueira gigantesca, vimos com outro olhar, e a casa da velha era coberta de gaiolas e brinquedos. A bola não achamos, mas a descoberta do mundo inexistente foi marcante para nossas vidas. Até hoje rimos quando nos encontramos.
Essa descoberta, que não era bem uma descoberta, foi marcante não só para nós, crianças, que vivenciamos aqueles momentos, mas também para os mais velhos, os pais, que aproveitavam a oportunidade para nos amedrontar, caso fizéssemos bagunça. Quando voltamos da descoberta, falamos para todos sem medo e com muito orgulho. Detalhe: a bola nunca achamos.
Autor: Glauber de Andrade Lacerda da Anunciação
São Gonçalo – RJ
Diluvio 2
Há 15 anos
2 comentários:
Glauber o bolg ta foda muito bonito, organizado, e achei maneiro esse seu texto, da rau da sua avó, gostei que vc ta colocando outras coisas além de geografia
abraço
Negro lindo e sabio com as palavras.
gostei muito dessa redação!!!
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